24 de junho de 2012. De olho na final da Libertadores contra o Boca Juniors, o Corinthians encarou o Palmeiras com seus reservas. Com um gol de letra no primeiro tempo e outro em chute potente na etapa final, um menino de 21 anos comandou a vitória. Três dias depois, entrou em campo aos 36 do segundo tempo na Bombonera e fez o gol do empate que encaminhou o time alvinegro a quebrar o tabu de jamais ter sido campeão continental. Nascia ali um mito.
Pouco mais de três anos depois, Romário Ricardo da Silva, o Romarinho, está no futebol do Catar há quase uma temporada. Artilheiro no Al Jaish, marcou 21 gols em 31 partidas até então, fez bons campeonatos e brigou até o fim, terminando em terceiro no torneio nacional - conquistando vaga na Liga dos Campeões da Ásia - e ainda alcançando uma decisão de Copa. Mas, como ele mesmo disse em entrevista ao ESPN.com.br, tem uma saudade...
"Tenho muita saudade de jogar contra o Palmeiras, porque é nos grandes jogos que você se destaca e ganha a torcida. Não adianta nada fazer um monte de gols contra o time pequeno e sumir contra os rivais que você não vai marcar história em um clube. Agora está ainda melhor porque cada time tem sua casa, fazer um gol no estádio deles seria ainda mais especial", afirmou Romarinho, em conversa por telefone.
O jogador deixou o Corinthians em setembro do ano passado com quatro títulos - Libertadores e Mundial 2012, Paulista e Recopa 2013 -, além de cinco gols em cinco jogos contra o arquirrival Palmeiras, com três vitórias, dois empates e nenhum revés. "A torcida ia ao delírio, mas os assessores do Corinthians ficavam doidos comigo naquela época, me davam broncas, mas o que posso fazer? Zoar o Palmeiras é mais forte do que eu", brincou.
Romarinho virou carrasco do Palmeiras em seu tempo de Corinthians
Confira, abaixo, entrevista do ESPN.com.br com o ex-corintiano Romarinho:
ESPN - Como estão as coisas no Catar?
Romarinho - Eu estou bem feliz morando aqui no Catar, aqui é um lugar bem tranquilo e não tem nada da correria do Brasil, trânsito, violência, monte de baladas, nada disso.
ESPN - Você foi vice da Copa do Presidente e tem feito muitos gols, certo?
Romarinho - A temporada passada foi muito boa para gente, eu estou atuando numa função diferente aqui, jogo mais perto do gol e estou mais artilheiro. O time precisa bastante de mim aqui, tenho mais espaco e sobram mais chances para mim, então sempre que posso eu guardo um gol.
ESPN - E a diferença cultural, como é?
Romarinho - O choque no comeco foi bem grande porque é um mundo totalmente diferente, bem deles mesmo na forma de se vestir, o que eles comem e tudo. É um povo mais fechado mesmo. Eles rezam muitas vezes por dia, tem vezes que o jogo atrasa porque está no horário da reza. Engraçado que no comeco eu até estranhava, no meio de um treino do nada todo mundo parava para a reza. Eu perguntava 'o que está acontecendo'? Mas hoje já me acostumei.
ESPN - Os dirigentes do Catar são famosos por dar luvas generosas aos jogadores. Já recebeu algum agrado?
Romarinho - Aqui no meu clube não é tão comum ganhar aqueles presentes caríssimos do sheik, a menos que você caia nas graças dele. Em outros times mais na liga aqui o mais comum é você receber um prêmio, tipo 10 mil reais, por ser o melhor jogador em campo.
ESPN - E todo mundo consegue te chamar de 'Romarinho' mesmo?
Romarinho - A torcida não consegue de jeito nenhum falar meu nome e se enrolam todos, por isso aqui virei o Roma (risos).
ESPN - E a torcida local, lembra a do Corinthians?
Romarinho - Nosso time ainda é muito novo e não tem tanta torcida, aqui os estádios quase nunca lotam, não tem o mesmo calor da torcida do Brasil. Do Corinthians então nem se fala, eles ainda têm muito para evoluir nesse aspecto.
ESPN - Já passou por alguma situação curiosa?
Romarinho - Eu nunca fui fã de dirigir desde sempre, quando fui sair pela primeira vez com o meu Astrinha, primeiro carro que tive,acabei batendo, acredita? Depois disso sempre evito dirigir, aqui no Catar minha esposa dirige para mim. Quando ela não está, um amigo meu chamado Abdel é quem pilota. Se ninguém dirige, o carro fica na garagem, porque sou muito desligado, não dá certo (risos). A minha fama de desligado é verdadeira, puxei para o lado da minha mãe. Lá em casa quem sofre é o meu pai e meus irmãos (risos).
ESPN - Você sempre foi desligado assim?
Romarinho - Para você ter uma noção, para ajudar em casa e tirar umas moedas eu trabalhava na minha infância vendendo coxinha em Palestina, minha cidade natal. E aí eu levava o isopor debaixo do braço e ia pensando em futebol, por isso ficava batendo com o joelho no isopor, como se estivesse petecando uma bola. Aí, quando tinha que abrir a tampa e oferecer para os clientes, as coxinhas sempre estavam tudo arregaçadas (risos). Um amigo meu que ia comigo sempre tinha as dele bem inteirinhas e vendia tudo, eu no final do dia tinha que comer as minhas para não estragar (risos).
ESPN - E corintinua assim até hoje?
Romarinho - Hoje eu sou tímido, fiquei bobão depois de adulto sei lá por qual motivo. Mas quando era crianca eu era bem cara de pau, acredita? E aí também vem as lendas que os caras criam, eu sou distraído, mas não do jeito que os caras falam (risos).
ESPN - No Corinthians diziam que você voltou ao Brasil depois do jogo contra o Boca e não entendia por que tanta gente queria falar com você no aeroporto. É verdade?
Romarinho - (risos) Jogador é f... e adora zoar, aumentar as histórias, ainda mais o Fábio Santos e o Sheik (risos). Quando eu fiz o gol da Bombonera não tinha noção do tamanho do que tinha feito, era muito moleque, tinha só dois meses de clube e era muito tímido. Claro que estranhei quando voltei ao Brasil e vi aquele monte de torcedores e jornalistas em cima de mim, mas não perguntei para eles o porque de tudo aquilo não (risos). Eles soltaram essa para poder brincar comigo e eu me soltar, deu certo (risos).
ESPN - Sente falta da época de Corinthians?
Romarinho - Eu tenho muita saudade dos amigos e da torcida do Corinthians, nas redes sociais recebo muitas mensagens da galera, ainda mais antes de jogo contra o Palmeiras. Você sabe que a zoeira nunca acaba, né, ela não tem limites, isso virou minha marca registrada (risos). Sempre que estou de férias no Brasil e vou em algum lugar, como um restaurante, os torcedores chegam em mim e tiram fotos, falam as frases 'Porque faz isso, Romarinho?' e 'A zoeira nunca acaba' (risos).
ESPN - E do que você tem mais saudades?
Romarinho - Tenho muita saudade de jogar contra o Palmeiras, porque é nos grandes jogos que você se destaca e ganha a torcida. Não adianta nada fazer um monte de gols contra o time pequeno e sumir contra os rivais que você não vai marcar história em um clube. Agora está ainda melhor, porque cada time tem sua casa, fazer um gol no estádio deles seria ainda mais especial. A torcida ia ao delÍrio comigo, mas os assessores do Corinthians ficavam doidos naquela época, me davam broncas, mas o que posso fazer? Zoar o Palmeiras é mais forte do que eu (risos).
ESPN - Você gravou um vídeo em fevereiro provocando o Palmeiras. Depois, o Marcos, ex-goleiro ídolo do Palmeiras, rebateu a sua brincadeira quando o Palmeiras venceu o Corinthians nos pênaltis. O que você achou?
Romarinho - Cara eu gravei o vídeo de fevereiro mas não achei que ia dar toda aquela repercussão, nem era para ser daquele jeito. Depois vi a resposta do Marcos em outro vídeo e achei muito engraçada, é tudo na brincadeira (risos).
ESPN - Acha que esse tipo de brincadeira faz falta no futebol?
Romarinho - Hoje em dia está mais complicado brincar por causa da violência, o futebol está sério demais. Claro que dentro de campo temos que ser sérios, lógico, mas não vejo problema de ter brincadeiras saudáveis como eu via quando era moleque, tipo como o Viola e o Túlio.
ESPN - Tem acompanhado o Corinthians de longe? O que está achando?
Romarinho - Eu acompanho até hoje o Corinthians, mas ficou mais difícil porque são sete horas de diferença, fiquei chateado que foi eliminado contra o Santos, mas estou feliz pela liderança do campeonato brasileiro. Fiquei triste pelo meu parceiro Luciano, que estava vivendo o grande momento da carreira dele, com muita confiança e se machucou, foi uma pena.
ESPN - Acho que é só isso, então, Romarinho. Valeu pela conversa!
Romarinho - Valeu! E eu sou desligado um pouco, amanhã ja não vou lembrar o que você falou comigo nem o que eu falei para você (risos).
Romarinho foi embora para o Catar, mas não foi esquecido pelos corintianos