29/7/2015 11:00

Dissidente da Democracia Corintiana, Rafael vive seu auge no título do Coxa

Da saída conturbada do Corinthians ao título brasileiro, goleiro visita o passado e lembra que sofreu tentativa de suborno sofreu antes da final com o Bangu, no Maraca

Dissidente da Democracia Corintiana, Rafael vive seu auge no título do Coxa
oritiba comemora o título brasileiro:"Tirei a concentração do Ado", lembra Rafael


Rafael Cammarota marcou sua passagem pelo futebol nos anos 70 e 80 como um goleiro sem comparação seja no seu estilo, comportamento e defendendo o gol dos times por onde passou. De cabelos longos e com o bigodão – sua marca registrada até hoje – era conhecido como um “suicida” por sair do gol para fazer a defesa sem temer os pés e joelhos dos atacantes adversários.

Também não era de aceitar calado desmandos e tinha opinião formada para tudo. Sua segunda passagem pelo Corinthians acabaria em poucos meses, depois de troca de acusações com a famosa “Democracia Corintiana” liderada por Sócrates e Casagrande, que Cammarota gosta de dizer que eram todos contra ele.

A saída do Parque São Jorge reaproximou o goleiro do Paraná, por onde já havia passado pelo Grêmio Maringá e ganhou o título de “São Rafael”. A partir de 1982, conquistou três títulos estaduais pelo Atlético-PR, mas, então, veio outra polêmica: a sua transferência para o arquirrival, o Coritiba.

O Atlético-PR não disputou o Campeonato Brasileiro de 1985, liberou seus atletas, e Rafael foi para o alviverde. No dia 17 de janeiro de 1985, o goleiro assinou com o Coritiba e, na apresentação, afirmou: “Vim aqui para ser campeão brasileiro”. Pouco mais de seis meses depois, Cammarota erguia a taça no Maracanã.

Nascido em 1953, Rafael Cammarota deu os primeiros passos no futebol nas categorias base do Corinthians e estreou nos profissionais em 1974. Depois construiu sua história como goleiro e atualmente com técnico. Ele relembrou no GloboEsporte.com e, confidencia, que até tentativa de suborno sofreu no hotel, horas antes de entrar em campo para decidir pelo Coritiba o título de campeão Brasileiro. Confira:




GloboEsporte.com: O treinador campeão foi o Ênio Andrade, mas antes de sua chegada, vocês foram treinados pelo Dino Sani por quatro jogos. Como foi aquele período?

Rafael Cammarota: Jogamos contra São Paulo e Cruzeiro, em casa, e vencemos. Então saímos para enfrentar Bahia e Vasco. Perdemos por 1x0 para o Bahia e o Dino saiu. Quem dirigiu o time contra o Vasco, já com o Ênio contratado, foi o Dirceu Kruger. Estávamos bem, mas a saída foi um pouco conturbada.

Nesse jogo contra o Vasco você e o Edson quase trocaram agressões...
- (interrompe) Era um período diferente, o futebol não é mais o mesmo. Hoje, dentro do vestiário, jogadores não falam mais, não discutem mais sobre futebol. O time está perdendo, ganhando ou empatando e, para eles, a sensação é a mesma! Antigamente era diferente; fui para cima do Edson porque ele estava rindo. Nós perdemos por 3x0, o vi rindo e fiquei puto. “Pô, tá rindo do quê?”. Foi um mal-entendido, mas foi positivo, vimos que precisávamos correr dobrado e provar para todos que o Coritiba tinha um time para chegar longe.

O que mudou com a chegada do Ênio?

- Já conhecia o Ênio de outros clubes, mas para nós foi excelente. Era um cara com um caráter inabalável, um baita de um treinador. Além da parte tática, que dispensa comentários, sabia se relacionar com os atletas além das quatro linhas: saía para tomar uma cerveja com você na sexta-feira, mas no sábado de manhã estava no campo, falando “aqui, dentro das quatro linhas, não tem amizade. Peço e vocês fazem.

Então quero que vocês joguem com prazer, com amor pela camisa”. Ele sabia separar as coisas. Tudo que ele falava, hoje percebo que é verdade.

Uma das boas histórias daquela conquista era que, além de goleiro, você também era o cozinheiro do time.


- O Osvaldo Sarti (massagista) falou para o Evangelino (presidente do clube) que eu cozinhava bem. Fizemos uma primeira vez e deu resultado, então toda sexta-feira o “China” (apelido de Evangelino) queria jantar conosco.

Macarronada era minha especialidade, sou nascido e criado dentro de padaria, restaurante... O engraçado é que eu ia para a cozinha e nós vencíamos. Todo mundo comia, jogadores, integrantes da comissão técnica e da direção do clube. Éramos muito unidos, o Evangelino era um presidente constante, sempre presente, não nos abandonava. Ele sempre brincava que queria um goleiro, mas contratou um grande cozinheiro.

Antes da partida contra o Santos, no final do segundo turno, teve uma “sessão de exorcismo” no Couto Pereira.

- Também foi obra do Osvaldo Sarti! Eu ajudei, tivemos que descer para o litoral e trazer água do mar para jogar nas traves e no campo.

Acendemos vela. Acendíamos de um lado e quando chegávamos do outro, as velas já tinham apagado. Estava um frio do caramba, quatro ou cinco graus e demoramos quase três horas para acender todas as velas. Mas valeu a pena, não é? Tomamos um sufoco danado, mas ganhamos o jogo.

Durante a campanha você chegou a dizer em uma entrevista que o time tinha que ganhar jogos e não dar show, pois quem dava show era o Menudo (o grupo se apresentou no Couto Pereira em 1985).

Existia uma cobrança muito grande para que o time apresentasse um futebol bonito?

- Cobrança sempre existiu. Hoje é que está uma “teta”. A cobrança em cima da gente sempre foi dobrada. Cheguei no Coritiba falando que seria campeão brasileiro. Tinha saído do maior rival e era ídolo lá. A torcida do Coritiba me detestava, para não falar de alguns jogadores. Então tinha que ganhar a confiança da torcida e dos meus companheiros. Consegui isso e hoje agradeço tudo o que o torcedor fez por mim. Nunca escondi minha ligação com o Corinthians, cresci lá dentro, mas hoje também posso dizer que sou coxa-branca.

Você não disputou o jogo de ida das semifinais contra o Atlético-MG. Na partida de volta houve um lance polêmico em que você agarrou a bola em cima da linha. Tem muito atleticano que até hoje contesta esse lance.

A bola entrou ou não?

- Tomei o terceiro cartão amarelo contra o Sport, no Couto. O José Roberto Wright me deu o cartão na sacanagem, achou que eu estava fazendo cera. Fiquei de fora na partida de ida contra o Galo, no Couto. O Jairo me substituiu e jogou demais. Voltei no Mineirão e foi uma partida muito desgastante,

emocionalmente falando. Passamos o maior sufoco. Sobre o lance, a bola não entrou. Tenho a sequencia de fotos, muito torcedor ainda duvida. Eu não esperava que o Gomes fosse cortar contra. Ele se apavorou com o Reinaldo entrando nas costas dele.

Pegou e deu carrinho na bola. No que ele tocou na bola, ela estava indo para dentro do gol. Se tomamos o gol ali, não venceríamos nunca! É a maior defesa da minha vida. Se a bola entra, a casa dele tinha caído. Depois que eu defendo, ele se benze no chão. Lembrando agora até vejo graça.


Goleiro guardou as lembranças do jogo em que o pênalti, no final, foi o momento crucial

Já na final contra o Bangu, o Maracanã estava lotado, quase 100 mil pessoas. Como foi subir o túnel e enfrentar toda aquela pressão?
- A expectativa era boa. Diziam que ser vice campeão já estava bom. Mas dizíamos “não”, iríamos para o Maracanã para conquistar o título.

O Bangu era um baita time, do meio para frente era excelente! Tanto que mais nos defendemos do que atacamos. Em compensação, o ataque deles estava toda hora na cara do gol. Foi um jogo atípico, já que fomos com o intuito de não deixar que eles viessem para cima.

Mas no Maracanã não tem como você se fechar completamente, até pelo tamanho do campo. E a torcida influencia muito: 100 mil pessoas jogando contra, era o Rio de Janeiro contra nós.

No Globo Esporte do dia da final, há uma entrevista com o Moisés, técnico do Bangu...


- (interrompe)Foi algo que nos deu muita força. Para ele, o Bangu já era campeão brasileiro. Rapaz, ele estava na praia, comendo camarão e tomando uma cerveja, dizendo que o título seria disputado no Maracanã e ficaria no Rio. Eu pensei “sacanagem”. Assistimos várias vezes e aquilo só nos motivou. Também diziam que nosso time era “velho”, o que só prova que não conheciam nossa equipe. Os mais velhos ali eram eu, Jairo e Almir. O resto tinha entre 24 e 28 anos; era uma garotada que tinha saído das fileiras do Coritiba. André, Tobi, Vavá, Eliseu...

Além das declarações do Moisés, também fala-se que o Castor de Andrade mandou deixar um caminhão de bombeiros pronto, com faixas de campeão para o Bangu.

- Era a diretoria toda do Bangu, todos tinham certeza que seriam campeões brasileiros. Eles não aceitavam nem comparações conosco, pela qualidade do time deles. Só que eles estavam em um ritmo mais fraco. Na semifinal, estavam jogando contra o Brasil de Pelotas no Maracanã e nós suando sangue contra o Atlético-MG, em Minas.

Na verdade, ninguém acreditava que passaríamos pelo Atlético-MG. Você sabe o que são 70 mil pessoas cantando ‘parabéns pra você’ para o Nelinho e fungando no seu cangote? E o Nelinho batia mal na bola, não é? Ali nós provamos para todos que não estávamos brincando e poderíamos conquistar o título.

Há uma história de que tentaram te subornar no hotel, antes da final?
- Eu e o André estávamos no quarto. Tínhamos dois meses de pagamento atrasado. Chegam duas pessoas e batem na porta. O que mandaram era muito pouco para mim. Na verdade, eu iria gastar o dinheiro, não faria diferença na minha vida. Hoje sou lembrado por ser campeão brasileiro. Antigamente isso era frequente, mas sabemos que existe no futebol até hoje. Só cai quem é trouxa.

Antes de o Ado cobrar o último pênalti do Bangu, você se aproxima dele e provoca, dizendo que sabia onde ele iria bater.

- Toda vez que tinha pênalti eu tentava desestabilizar o cobrador. Tinha que tirar a tranquilidade dele: aí para mim, goleiro, o gol crescia; para o atacante, diminuía. Em uma decisão daquelas, a responsabilidade era muito grande. Ele quis mudar o canto na hora em que foi bater, se você for ver, 90% dos batedores que fazem isso, erram. Não dá para mudar o canto.

Ele ia bater no canto esquerdo, aí na hora ele quis mudar. Um tempo atrás, em uma gravação que fizemos no Rio, repetimos a cobrança. Dessa vez entrou. Ele estava com isso 30 anos nas costas. Se eu pegasse o pênalti ele iria dizer: ‘Pô, você quer me ferrar?’.

Logo após a conquista do título, você “provoca” o Corinthians em uma entrevista.


- Sou nascido e criado dentro do clube, nunca neguei isso. Me tornei coxa-branca, mas sempre fui corintiano. Agora, o que fizeram comigo foi sacanagem.

A tal “democracia” lá era tocada por quatro; eram quatro contra mim. Sempre fui um cara sincero, falava o que achava que tinha que falar. Então disse que a Democracia Corintiana tinha implodido e que o Rafael tinha vencido. Enfim, passou. Se fosse hoje, pensaria duas ou três vezes antes de desabafar; tudo o que fiz no estado do Paraná, poderia ter feito no Corinthians.

De qualquer forma, isso não afetou em nada meu relacionamento com o clube. Quem perdeu com isso foi o Corinthians.

Saí de lá, fui campeão de tudo, fui para a seleção brasileira, o que mais posso querer?

O que o Corinthians ganhou na “democracia”?

Só um Campeonato Paulista. Deixei o Parque São Jorge com o meu Opala, carro da época, e o Leão entrou de Mercedes. Ele perguntou para mim como era o clube e respondi “Você vai ver o que é trabalhar aqui”. Ele também não se deu bem por lá e um ano depois o dispensaram por telefone.

O que mudou no futebol nessas três décadas?

- Rapaz, muita coisa. Hoje só tem “estrela”, não é? Os caras ganham muito para jogar pouco. Nós tínhamos que jogar muito para ganhar pouco. E você amava a camisa que você vestia. Não há mais essa relação, é tudo profissional ao extremo. Troca-se de clube com muita facilidade e ninguém reconhece o que a instituição fez por você, não há vínculo nem com o torcedor. Tem que ser grato, demonstrar vontade e honrar a camisa. Até costumo brincar: se eu jogasse hoje, estaria milionário.

Toda a história do título do Coritiba será contada durante a semana e, no dia 31 de julho, você acompanha a íntegra do jogo de 1985 aqui no GloboEsporte.com. A transmissão será a partir das 15h da sexta-feira. Acompanhe as notícias, leia as histórias e se prepare, pois, no final de semana, o Coritiba vai ser campeão brasileiro



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