23/3/2015 13:31

Tite revela emoção no "7 a 1", cobra mudança geral e não vê Timão pronto

Após se surpreender com trabalho no Real Madrid, treinador pede atualização de técnicos e dirigentes, diz ainda pensar na Seleção e acha difícil ter chance na Europa

Tite revela emoção no
Tite concede entrevista no CT do Corinthians (Foto: Diogo Venturelli)

Tite decidiu aprender quando, talvez, já pudesse ensinar. Esqueça o técnico campeão da Libertadores e do Mundial de Clubes em 2012. Ele esqueceu e por um ano enfiou a cara em livros, vídeos e no convívio com outras estrelas da bola. A versão 2015 do treinador mais badalado do país fala com propriedade sobre o que há de mais moderno no futebol mundial e adota um tom mais crítico. A ponto de cobrar que colegas de profissão, dirigentes, imprensa e atletas busquem aperfeiçoamento profissional para evitar um novo “7 a 1”.

– Tomara que eu não ouça mais nenhuma vez das pessoas que o importante é vencer. Isso uma criança de três anos sabe. Que fiquem atentas ao processo, à construção. Que elas fiquem atentas a tudo que se possa fazer para que possamos vencer – afirmou.

O gaúcho de hábitos simples não quis saber de pouca coisa para se aperfeiçoar. Visitou Arséne Wenger no Arsenal, trocou figurinhas com Carlos Bianchi no Boca Juniors, mas foi no Real Madrid de Carlo Ancelotti que encontrou um novo norte.

Do banco de reservas, Tite viu Cristiano Ronaldo, o melhor do mundo, com seu cabelo engomadinho e suas poses para as câmeras, tratar como um jogo de verdade um simples treinamento.

– É uma ideia, um conceito, que eu trago comigo. Você faz treinamentos para a tomada de decisões rápidas, porque o jogo está cada vez mais rápido. Se não fizer, não adianta projetar algo para o jogo – cravou.

Tite voltou ao Corinthians sedento por vitórias. Venceu 12 dos 15 jogos oficiais que fez no ano e não perdeu nenhum, mesmo em meio aos atrasos no pagamento de dos direitos de imagens dos jogadores. Transformou a desconfiança da torcida em esperança para conquistar o segundo título da Libertadores. Só não diga que o time está pronto...

– Se eu dissesse que sim, quem lesse a entrevista diria que o treinador é muito burro.

Depois de se emocionar ao ver o Brasil sofrer sua pior derrota na história, Adenor Leonardo Bacchi espera o futebol nacional mais organizado e planejado. Vencer só com o talento já não serve mais. O emocional Tite quer menos coração na tomada de decisões. Sonha alto. Sonha ainda comandar a Seleção, cargo que o clamor popular não foi o bastante para fazê-lo alcançar após a saída de Felipão.

– Tomara que seja quando terminar a Copa do Mundo. Antes, não falo por demagogia, deem todo o trabalho (ao Dunga), direcionem.

GloboEsporte.com: Treinador ganha jogo?
Tite:
Não. Contribui. Mas não ganha.

Você contribuiu mais em alguma vitória?
Grêmio e Nacional-URU, quartas da Libertadores (2002). Grêmio no 3-5-2, com Gilberto na ala esquerda, e eu coloquei o Rodrigo Fabri. A bola entra no pivô e, na primeira vez que ele toca nela, faz o gol. Aí eu me senti um pouquinho participante direto. Fazer o gol no primeiro toque na bola é significativo (risos).

Mas já deve ter perdido também...
Teve jogo que contribuí mais para perder. Jogando Caxias e São José, 1 a 0 para nós (Caxias), coloquei um jogador que não estava nas melhores condições físicas, mas tecnicamente vinha muito bem no jogo. Para poupá-lo, eu o tirei. Coloquei um jogador que não entrou bem, a equipe fez assim (aponta para baixo) e perdemos por 2 a 1. Eu ajudei muito a equipe a perder.

Foi em um momento assim que você decidiu estudar mais o futebol?
Isso está ligado a algumas frases feitas que eu não comungo e luto. Tipo assim: “a derrota nos ensina”. O que nos ensina é a derrota, o empate e a vitória, desde que tenhamos conhecimento para tirar lições boas, correções ou coisas positivas. Tudo nos ensina.

O que essa busca pelo conhecimento acrescentou ao seu trabalho?
Você só vai ter necessidade de algo que conhece. Se não conhece, como vai ter necessidade? Opinião eu só tenho quando conheço. A busca de conhecimento é fundamental. Ela reafirmou conceitos e me fez rever outros. Tenho domínio do 4-1-4-1, coisa que não tinha. Qual a função dos meias abertos? O que fazem? Quer dois (jogadores) de velocidade? Um de articulação? Eu e o Cleber (Xavier, auxiliar) estudamos as imagens a respeito da França e da Alemanha no 4-1-4-1, além da metodologia de treinamento. Não adianta conhecer sistema se não souber empregar. Aí vai ser bom para a entrevista, para um gráfico. Se eu não trouxer para o atleta no campo, não vai ter sentido.

Técnico é supervalorizado?
Sim. É próprio da cultura do “se ganhou é o cara, se perdeu é o culpado”. Futebol não é assim. Técnico tem parcela importante? Tem. Precisa se atualizar cada vez mais? Precisa. Mas ele é, sim, supervalorizado. O valor tem de ser do conjunto da equipe.

Você foi conhecer a rotina de técnicos e clubes na Europa. Qual a diferença que mais impressionou em relação ao Brasil?
O Arsenal, que não é o top dos tops, tem um investimento altíssimo, a ponto de tirar o Ozil do Real Madrid. Nós sofremos para manter uma base da equipe. O Chelsea, que vencemos em 2012, mantém seus principais atletas. Eles têm um poderio econômico muito forte. A média dos técnicos no Campeonato Inglês é de 16 meses (no cargo). Isso é utopia no Brasil. Quando passa um ano, estoura foguete. Por quê? Porque é um processo de organização diretiva, de mentalidade, de formação, para dar tempo ao trabalho. Isso tudo é um processo evolutivo que precisamos também.

Os técnicos brasileiros estão atrasados na comparação com os europeus?
Eu não conheço muito os outros técnicos, mas posso dar indícios ao meu respeito. Carlo Ancelotti (técnico do Real Madrid) fazia um treinamento, e eu não queria ir à beira do campo, não gosto de ocupar espaço. Ele me disse para ficar no banco. Pegando os principais jogadores, como Sergio Ramos, Toni Kroos e Cristiano Ronaldo, um nível de concentração altíssimo, competitivo, não tira o pé...e eu observando. Depois, Ancelotti colocou que ele não abre mão do trabalho com uma intensidade alta, com o cara concentrado. É uma ideia, um conceito, que eu trago comigo. Você faz treinamentos para a tomada de decisões rápidas, porque o jogo está cada vez mais rápido. Se não fizer, não adianta projetar algo para o jogo.

Você acredita, então, que os técnicos brasileiros precisam dessa atualização?
Os técnicos, os dirigentes, os atletas, a imprensa, o conjunto da obra precisa evoluir. Vejo que é muito fácil pegar um placar dilatado e ficar colocando que (a culpa) foi isso ou aquilo. Se nós não contextualizarmos, é muita ingenuidade ou fuga da responsabilidade. Eu não preciso ficar dando treino privativo. Em alguns momentos, não quero vídeo ou áudio, interajo com o cara, falo “porra, que merda”...Pego esse exemplo porque foi surpreendente: Felipão dando treino na véspera do jogo contra a Alemanha pedindo silêncio para um cara na cerca porque precisava dar treino. Isso é inconcebível em alto nível.

A derrota do Brasil para a Alemanha na Copa do Mundo foi um caso isolado?
Não. O 7 a 1 foi reflexo de um contexto de uma equipe num momento extraordinário. Meu sentimento com a Alemanha campeã foi de que o futebol venceu. Não queria a Argentina, não pela rivalidade, mas pelo melhor futebol ser da Alemanha. Não vamos pensar no jogo, mas no Mundial todo.

Qual foi seu sentimento ao ver aquele jogo?
Eu estava no meu apartamento em São Paulo com a minha esposa assistindo. Quando deu o quarto gol, minha esposa levantou e começou chorar. Ela projetou a exposição do técnico. Eu também me emocionei, pensando “não pode ser, não pode ser, não pode ser”... A emoção ficou aflorada com o quarto gol em tão pouco tempo.

Treinador brasileiro ainda é um pouco arrogante em admitir que precisa estudar ou que outros são melhores?
Difícil essa resposta, tchê. Em contrapartida, como o Abel Braga disse, depois do 7 a 1 se um pingo de água cai aqui a culpa é nossa. É o oposto da coisa. O treinador é uma peça integrante. Não sei quantificar em percentual. Técnico não é nem "o cara" e nem o culpado.

Tite admite que sonha dirigir a seleção brasileira (Foto: Diogo Venturelli)

Muricy um dia disse que um treinador europeu só ganharia nota 10 se trabalhasse no Brasil. Você acha que Guardiola e os mais renomados na Europa dariam certo aqui?
Vamos pegar a ideia ao invés de só a afirmação do Muricy. Eu gostaria de ver esses profissionais trabalhando aqui para formatar minha ideia. Aqui existem particularidades importantes. Uma delas é a mudança de equipe a cada seis meses. Todos dariam certo, mas teriam um tempo. Os dirigentes teriam mais paciência? O Gareca não serve para o Palmeiras, mas serve para a seleção peruana? Depende das pessoas, de quanto churrasco e quantas pizzas os dirigentes comerem com o técnico antes de contratá-lo.

Por que há tão poucos técnicos brasileiros no exterior?
Não uso como desculpa, mas enquanto não tiver fluência na língua, não vai. Como eu vou falar para o Lampard retardar a jogada, para ele deixar a primeira opção acontecer, a segunda, a terceira... não consigo, não adianta! Eu fui para os Emirados Árabes Unidos para ficar com minha família e ganhar dinheiro, mas não atingiria o top. Fluência é pré-requisito.

Então, você não vai dirigir um grande clube europeu?
Só se for da Itália ou de Portugal. Da Espanha, só eu fizer um intensivão, porque é fácil (risos).

Quem é o melhor técnico do Brasil na atualidade?
Não existe o melhor. Existe quem está melhor ou um grupo de profissionais que está em bom momento. Eu estou entre eles. Pega cinco, seis, sete....os que estão em atividade. Escolhe você. Gosto de colocar um patamar, e estou inserido nele.

Essa busca por referência na Europa não atrapalha a formação do jogador talentoso no Brasil? Hoje, encontramos muito menos atletas de habilidade do que há algumas décadas.
Se as pessoas perguntarem onde eu nasci, vou falar Rio Grande do Sul e vão dizer que não sou gaúcho. Gaúcho tem muito essa situação de que precisa ter acima de 1,80m e ser forte. Para mim, não tem de ser forte, tem de ser bom. Mas existem profissionais que trabalham dessa forma. Eu gostaria muito de saber (porque há menos jogadores talentosos). Sinto falta de Zico, Cerezo, Sócrates, Clodoaldo. Talvez, seja um contexto, um deles a metodologia, talvez a entressafra de ter jogadores com essa luz, um Lampard da vida. No Mundial, ele meteu uma bola para o Fernando Torres que, no banco, eu falei: “Filho da puta!” Ele pegou de costas, girou e lançou. O que ele fez? Isso é luz. Danilo, Jadson, Renato Augusto, Douglas, Giuliano, D’Alessandro, Ganso, Valdivia têm isso...Lucas Lima tem repentes disso.

Tite analisa o atual momento do futebol brasileiro (Foto: Diogo Venturelli)

A recuperação do futebol brasileiro passa também por uma reestruturação da CBF?
Também. Mas precisamos começar comigo e a classe dos técnicos, todos procurarem uma atualização maior, um nível de conhecimento maior. Bota cursos padrão UEFA para formandos em educação física e ex-atletas. Que bom que estão surgindo os executivos do futebol que podem fazer essa ligação (com a diretoria) e não ficar a critério do técnico indicar a contratação ou venda de jogador. Isso faz elevar nível e padrão.

Qual avaliação você faz até agora da Libertadores?
Posso falar melhor no fim do primeiro turno. River e Boca cresceram em qualidade individual e coletiva. Cruzeiro está se reformulando, Inter e Atlético-MG também. Falei com Edgardo Bauza (técnico do San Lorenzo) e ele tem a mesma opinião. No nosso grupo, qualquer um que saísse, classificaria em outro. São três campeões da Libertadores.

O Corinthians vem com uma grande campanha e já desponta como um dos favoritos ao título. Está pronto para ser campeão?
Não. Se eu dissesse que sim, quem lesse a entrevista diria que o treinador é muito burro de afirmar isso com 18 jogos. O time cresce, aprende, erra e vai ter de reagir a situações adversas, do tipo sair perdendo. Só saímos perdendo os dois primeiros jogos contra Colônia e Bayer (amistosos). Temos de aprender em cima da adversidade, esse é outro desafio.

O clube admite que tem alguns meses de direitos de imagem atrasados. Você também seria um deles. Isso preocupa?
A maior riqueza que um clube tem é a credibilidade das pessoas que dirigem. O clube está muito rico na credibilidade de quem comanda. Roberto de Andrade (presidente) tem credibilidade suficiente para dizer as coisas e as pessoas confiarem. Eu sinto isso. E sei que os atletas também sentem.

Você era o mais cotado a assumir a seleção brasileira, mas a vaga ficou com Dunga. Aquilo foi uma frustração?
Tive dez dias de elaboração. Depois, seguiu. Até porque meu objetivo é o crescimento profissional. Esse é o desafio que eu trago: ser melhor. De Fábio Santos e Renato Augusto pensarem que vou vir com os mesmos treinos ou vou trazer algo novo? As oportunidades vão ser inevitáveis. Retornar para o Corinthians aconteceu antes do que eu imaginava. E não pensava. Não era uma boa, né? Era fácil dizer não, manteria minha imagem. Se o cara que viesse depois ganhasse, não seria mais do que eu fiz. Aliás, nada do que fizermos agora vai ser mais do que antes.

Mas dirigir a seleção brasileira ainda é um desejo?
Tomara que seja quando terminar a Copa do Mundo. Antes, não falo por demagogia, deem todo o trabalho (ao Dunga), direcionem. Tomara que eu não ouça mais nenhuma vez das pessoas que o importante é vencer. Isso uma criança de três anos sabe. Que fiquem atentas ao processo, à construção, que elas fiquem atentas a tudo que se possa fazer para que possamos vencer.


VEJA TAMBÉM
- VALOR MILIONÁRIO! Corinthians pode faturar alto se vencer a Libertadores Feminina 2024
- SERIA HISTÓRICO! Torcida organizada apresenta plano para quitar a Neo Química Arena
- VIRADA DE CHAVE! Corinthians cresce de desempenho após contratação de Memphis Depay









10095 visitas - Fonte: GE

Mais notícias do Corinthians

Notícias de contratações do Timão
Notícias mais lidas

Nenhum comentário. Seja o primeiro a comentar!

Enviar Comentário

Para enviar comentários, você precisa estar cadastrado e logado no nosso site. Para se cadastrar, clique Aqui. Para fazer login, clique Aqui ou Conecte com Facebook.

Últimas notícias

publicidade

Copa do Brasil

Dom - 16:00 - Neo Química Arena -
X
Corinthians
Flamengo

Brasileiro

Qui - 20:00 - Neo Química Arena
5 X 2
Corinthians
Atletico Paranaense
publicidade
publicidade
publicidade