Nesta quarta-feira, Tite volta à Libertadores com o Corinthians, para enfrentar o Once Caldas, às 22h (horário de Brasília), na Arena Corinthians. O treinador foi o responsável por acabar com o histórico jejum alvinegro na competição continental, vencendo o torneio em 2012 - um título que o alçou à condição de mito no Parque São Jorge.
Tudo isso não teria sido possível se, em 2000, quando ainda estava começando sua carreira de técnico, o gaúcho não tivesse dado a maior bronca de sua vida no estádio do Caxias, clube que comandava à época.
Quem conta a história é um dos que estavam no vestiário naquele dia: o goleiro Gilmar Dal Pozzo, ex-técnico da Chapecoense, que tem Tite como padrinho de casamento. O causo aconteceu durante o Gauchão de 2000, ano em que o time de Caxias do Sul vivia situação financeira complicada, com três meses de salário atrasado.
"Tínhamos um grupo muito unido e brigávamos contra todos estes problemas. Um dia, porém, estávamos desanimados, jogamos mal e perdemos do Veranópolis, pela fase de classificação. Aí o bicho pegou...", lembrou Dal Pozzo, em entrevista à Rádio ESPN.
No dia seguinte, Tite reuniu todos os atletas e soltou cobras e lagartos.
"Ele perdeu completamente a compostura e o equilíbrio, que são até hoje as características dele. Começou a fazer uma cobrança forte, começando por mim. Até então, eu o tinha como amigo, comandante e padrinho de casamento. Ele começou a fazer uma cobrança de cima em baixo, com vocabulário totalmente diferente, chutou o balde, falou diversos palavrões e começou por mim, que era o capitão. Eu fiquei apavorado, falei para minha esposa em casa: 'Cláudia, o homem ficou louco (risos)!'", narrou.
Segundo Dal Pozzo, porém, aquele foi o dia em que Tite se transformou em um técnico de ponta. Após xingar todo mundo no vestiário, o Caxias se reencontrou no Gauchão, e deu uma arrancada fulminante até o título, conquistado em cima do Grêmio de Ronaldinho Gaúcho, Zinho, Ânderson Lima e Ânderson Polga.
Foi a primeira grande taça do treinador, que em seguida seria contratado pelo próprio tricolor de Porto Alegre, clube que o tornaria nacionalmente famoso.
"Ele tem aquele vocabulário de recursos humanos, mas às vezes é preciso utilizar o linguajar do boleiro, que é diferente. Hoje, falo que depois daquele episódio, ele cresceu e evoluiu ainda mais como técnico, porque soube cobrar na hora certa e deixar de lado a amizade e o companheirismo para agir como líder. Às vezes, nós, técnicos, precisamos ser mais duros nas cobranças, e issso foi determinante para o Tite", opinou.
"É um cara muito sereno calmo e ponderado, mas às vezes ele quebra os quadros do vestiário (risos). Ele tem uma mentalidade de vencedor, desde o Veranópolis ele já tinha objetivo de ser campeão, ele passa isso para o atletas que compram a ideia", completou.
Os dois seguem amigos, assim como suas famílias. Sempre que possível, se reúnem em churrascos, nos quais, inevitavelmente, conversam sobre... futebol.
Dicas de Ancelotti
Tite e Dal Pozzo trabalharam juntos por sete anos, como técnico e jogador. O ex-goleiro é até hoje o atleta que esteve junto do treinador por mais tempo na carreira, e sempre teve certeza que o padrinho de casamento estava destinado a grandes conquistas.
"Desde aquela época, eu já via um potencial enorme nele, mesmo ele tendo apenas 29 anos. Tinha certeza que ele um dia ia treinar grandes equipes do futebol brasileiro. Claro que não imaginava que faria tanto sucesso, sendo campeão do mundo e tudo mais. Conhecendo o Tite, sei que ele vai em busca de ser um dia o técnico da seleção brasileira. Tive a oportunidade de aprender muito dentro e fora de campo, hoje sou pai de família e tenho muita influência da educação que eu aprendi com ele", contou o homem que levou a Chapecoense à primeira divisão do Campeonato Brasileiro.
Outra característica que Dal Pozzo aprecia no mentor é o fato de Tite ter aproveitado seu ano sabático depois que saiu do Corinthians, em 2013, para se aperfeiçoar, mesmo depois de ter conquistado quase todos os títulos possíveis pelo Corinthians, como o Mundial de Clubes, o Brasileirão e o Paulistão, além da Libertadores.
As melhores dicas, segundo o afilhado, vieram do italiano Carlo Ancelotti, técnico do Real Madrid.
"Ele se reciclou bastante nesta parada que teve. Foi à Espanha e trouxe muitas informações do Carlo Ancelotti, que é um cara que dispensa palavras. Eu e ele também discutimos muito sobre táticas e coisas relacionadas aos jogos neste período em que ele ficou sem trabalhar", relatou Dal Pozzo.
"Ele é muito disciplinado e trago isso comigo até hoje. Sou grato de ter aprendido muito com ele, um cara sensacional e profissional de alta qualidade", encerrou.