Reportagem do NYT detalha esquema de manipulação de resultados no futebol (Foto: Reprodução New York Times)
Dois pênaltis com bola na mão, sendo que, nos dois casos, a bola não passou nem perto da mão. Foi assim, com marcações controversas, que a África do Sul, então treinada por Carlos Alberto Parreira, venceu a Guatemala por 5 a 0 em um amistoso antes da Copa do Mundo de 2010. O árbitro Ibrahim Chaibou, do Níger, não pensou duas vezes antes de apontar a marca fatal, mas o tempo mostrou que a atitude dele naquela noite ia muito além das questões técnicas. Uma investigação da Fifa, revelada em reportagem do jornal americano The New York Times, detalha um esquema de manipulação de resultados em amistosos pré-Copa em 2010 para beneficiar apostadores. Segundo a apuração da Fifa, Chaibou teria recebido 100 mil dólares naquela partida. Oficialmente, ele nega todas as acusações.
A reportagem publicada neste fim de semana pelo NYT começa com a descrição do momento que o árbitro chega ao banco para depositar o dinheiro, levado em uma sacola em notas de US$ 100, poucas horas antes do jogo. O montante era tão incomum para o banco que o juiz ganhou de presente moedas comemorativas com a imagem de Nelson Mandela.
O documento confidencial da Fifa, ao qual o jornal americano teve acesso, afirma que Chaibou foi escolhido para aquele amistoso pela empresa Football 4U, sediada em Cingapura e ligada a uma quadrilha de manipulação de resultados no futebol. O árbitro também foi investigado um ano depois daquela partida, quando marcou um pênalti suspeito no amistoso entre Argentina e Nigéria no dia 1º de junho de 2011.
Pienaar, craque da África do Sul, no polêmico amistoso de 2010 contra a Guatemala (Foto: Getty Images)
Apesar de se tratar de amistosos, a reportagem parte da investigação para levantar questões sobre a vulnerabilidade da Copa no Brasil, que começa no dia 12 deste mês. Cita, inclusive, uma declaração de Ralf Mutschke, chefe de segurança da Fifa, ao site da entidade no dia 12 de maio deste ano.
- Os manipuladores estão procurando jogos que geram um volume muito grande de apostas, e obviamente os torneios internacionais de futebol como a Copa do Mundo geram esse volume. Então a Copa, no geral, tem um certo risco – afirmou Mutschke.
Ibrahim Chaibou também levantou suspeitas em uma partida entre Argentina e Nigéria em 2011 (Foto: AP)
O documento da Fifa, que tem 44 páginas, revela detalhes do esquema montado pelos apostadores para manipular pelo menos cinco amistosos de preparação para a Copa do Mundo da África do Sul. Pelo menos 15 partidas estavam no radar dos criminosos, incluindo um duelo entre Estados Unidos e Austrália. Além da cena do árbitro depositando o dinheiro no banco, várias outras são descritas na investigação, mostrando a facilidade como os resultados são manipulados. Até ameaças de morte são citadas.
A Fifa concluiu que o esquema de 2010 contou com a ajuda de executivos do futebol sul-africano. Ainda assim, ninguém foi acusado formalmente ou banido de suas atividades. Na semana passada, uma porta-voz da Fifa admitiu que as investigações sobre o caso continuam em curso.
No caso de África do Sul x Guatemala, o esquema começou a ser montado com semanas de antecedência. Um homem identificado como Mohammad foi até o escritório da Federação Sul-Africana levando uma carta datada de 29 de abril de 2010. O documento oferecia árbitros para os amistosos da seleção do país-sede da Copa, cobrindo despesas de viagem, hospedagem e alimentação. A assinatura era de Wilson Raj Perumal, executivo da Football 4U e notório apostador conhecido como o maior manipulador de resultados do esporte mundial.
O árbitro Chaibou nega que conheça Perumal, mas o documento da Fifa detalha a relação entre os dois, incluindo a negociação para a manipulação do amistoso. “Eu posso fazer o serviço”, teria dito o juiz.
O New York Times afirma que “várias federações nacionais cujas seleções vão competir no Brasil são tão vulneráveis quanto a sul-africana, com problemas financeiros, em crise administrativa e divididas politicamente.