Com seus oito, nove copos d’água devidamente alojados na pequena bancada de uma cabine minúscula, quase toda ocupada por equipamentos de som, Edson Sorriso, 54 anos, cumpre religiosamente um roteiro antes do início das partidas no Pacaembu.
– Este é o Estádio Municipal Paulo Machado de Carvalho. O seu, o meu, o nosso Pacaembu.
O bordão será repetido neste domingo para o duelo entre Corinthians e Flamengo, que marca a despedida do Timão do estádio – o clube alvinegro está de mudança para sua nova Arena. Como a alcunha denuncia, Edson, locutor oficial do Pacaembu há três anos, solta um sorriso fácil a cada novo bordão que cria para empurrar os corintianos. Além de funcionário da Prefeitura de São Paulo, o locutor é também cantor e compositor de samba.
O vozeirão e a facilidade em criar boas frases fizeram de Sorriso o substituto de “seu” Milton, corintiano fanático que era a voz do Pacaembu até sua morte, em 2011. No primeiro jogo, com a seleção brasileira feminina, o novo locutor sentiu o nervosismo. Aos poucos, passou a dominar a nova função.
– A mão tremia no microfone, mas aos poucos me soltei. Eu fui chamado às pressas, improvisado. Desde então, fiz centenas de jogos do Corinthians e de outros clubes, mas mais do Corinthians, claro. Hoje, sou um improvisado que deu certo – brincou a voz do Pacaembu.
Ao contrário de seu Milton, alvinegro declarado, Edson Sorriso não diz o seu time de coração – “sou muito patriota, vibro mesmo é com a seleção brasileira”. Presente em cada jogo do Timão no Pacaembu nesses últimos três anos, ele participou de grandes emoções, títulos e derrotas. E passou, claro, por situações inusitadas.
– Em 2011, o Corinthians foi campeão brasileiro aqui, contra o Palmeiras. E no Rio, o Vasco pegava o Flamengo. Um gol do Vasco poderia prejudicar o Corinthians e eles fizeram 1 a 0. Chegou uma ordem aqui para que o gol não fosse anunciado. Fiquei na minha. Quando o Flamengo empatou, anunciei, e o Tite logo olhou para cima e vibrou. Achava que estava 1 a 0 para o Flamengo. Ficou tão confiante que acho que ajudou na conquista daquele título – lembrou.
A campanha da Libertadores de 2012 também teve a voz de Edson. Desta vez, porém, um pouco abafada pelos corintianos.
– O som da torcida, muito alto, quase não deixava a gente trabalhar. Isso aqui estava lotado. Toda aquela campanha teve casa cheia, é um aspecto muito marcante da torcida do Corinthians – ressaltou o locutor.
Neste domingo, Edson Sorriso terá novas frases para os corintianos. Muitas criadas pelo próprio clube e apenas repassadas à administração do estádio. Antes do jogo, o locutor promete uma homenagem especial ao clube.
– Não tem nada planejado, vou deixar a emoção me mover na hora. Mas é claro que farei um agradecimento especial a esse clube que trouxe tantas alegrias às arquibancadas, histórias e, claro, muito trabalho para nós. Claro que o Corinthians fará falta. Mas espero que outros times continuem por aqui – explicou Sorriso.
Em sua pequena cabine, ele faz os procedimentos de praxe, anuncia preços de alimentos, placares de outros jogos e recomendações da Polícia Militar. No segundo tempo, informações de público e renda.
No meio de tudo isso, surgem frases mais filosóficas, sobre racismo, violência nos estádios e outros temas polêmicos. À torcida do Timão, com um sorriso no rosto, Edson pedirá mais uma vez “paz e harmonia” para uma grande festa na despedida do Pacaembu..