2/4/2014 14:34

Para tribunal, corintianos chamarem Rogério Ceni de 'bicha' no estádio não é homofobia

Para tribunal, corintianos chamarem Rogério Ceni de 'bicha' no estádio não é homofobia
Os conhecidos gritos de "bicha" de corintianos para o goleiro Rogério Ceni chegaram ao Tribunal de Justiça Desportiva de São Paulo. Para o TJD, no entanto, a atitute dos torcedores no estádio não é homofóbica. O presidente do órgão, Mauro Marcelo de Lima e Silva, decidiu arquivar as denúncias, que poderiam até resultar em punição para o prórprio clube do Parque São Jorge.

Pelo menos três representações chegaram à entidade: por parte da Coordenação de Políticas LGBT da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania da Prefeitura de São Paulo, a segunda parte por um advogado e também uma terceira, do Grupo de Advogados pela Diversidade Sexual.

Todas elas tinham um mesmo pedido: providências em relação ao comportamento da torcida do Corinthians durante o jogo contra o São Paulo Futebol Clube ocorrido no dia 9 de março.

Durante esta partida, bem como em outras, por diversas vezes, quando Ceni tocava na bola, os torcedores gritavam em coro "ôôôôôô ....... bicha!!".

De acordo com a decisão do presidente do TJD, para o ato se configurar homofobia faltaram outros elementos, que não foram identificados.

"O que ocorreu com Rogério Ceni no mencionado jogo foi homofobia? Claro que não. Faltou ali o "animus" da vontade positiva e dolosa de criticar a opção sexual do atleta, existindo uma distância muito grande entre o que aconteceu com ele e uma atitude realmente homofóbica. Não houve ofensa à sua sexualidade ou orientação sexual", afirma Mauro em sua decisão.

"O que aconteceu foi mais um deboche público, uma zombaria, uma piada em coro, uma grande piada politicamente incorreta motivada pelo que a psicologia social e de massa chama de "efeito manada", em que os torcedores - dentro do seu grupo e levados pela emoção do momento - esquecem qualquer tipo de ética, valor moral e bons costumes, propendendo a cometer atos e condutas que não os praticariam e nem teriam de modo individual", completa.

Mauro Marcelo de Lima e Silva ainda reconhece o ambiente machista que é o futebol, mas diz que não houve na conduta uma decisão consciente dos torcedores.

"Vivemos hoje uma realidade plural, diversa e diferente e de difícil aceitação para uma sociedade "heterocentrada" como a nossa. Comportamentos que antigamente eram considerados desviantes da sociedade, hoje são aceitos. É certo que precisamos "despreconceitualizar" e debater, sem paixões, a diversidade sexual, homossexualidade e homofobia no universo futebolístico, esporte esse que é sempre considerado uma prática masculina, viril, "coisa de macho", mas com isso, carregando uma péssima fama de ambiente altamente preconceituoso e propício a incitar o ódio, a exclusão e a homofobia", começa.

"Apesar do pensamento coletivo machista, proferido em uníssono no estádio por esses torcedores hipnotizados pela união do grupo, não havia na conduta uma decisão consciente, mas uma simples euforia coletiva motivada pela tensão emocional do jogo e o calor das arquibancadas, que são as molas propulsoras desse irracional comportamento verbal em que os indivíduos passivos apenas seguem a maioria", completa.

Preocupado com a linha tênua que divide a brincadeira da ofensiva e propõe medidas de prevenção para evitar que preconceitos e discriminações sejam frequentes no futebol.

"Mas, é bom salientar que a linha divisória entre o jocoso e o ofensivo é tênue; a conduta dos torcedores alvinegros - apesar de, em princípio, não configurar como ilícito e não ser homofóbica - é perigosa, um reforçador de discriminação, intolerância e desrespeito à diversidade, comportamento esse que, se não for orientado e coibido, pode descambar para ações mais violentas, pois dentro do grupo, dentro do coletivo, podem existir indivíduos sem o necessário discernimento".

"Enlouquecidos e ferozes pela atmosfera gerada pelas massas, eles podem partir para ações individuais e, aí sim, configurar a homofobia e até condutas mais graves. Precisamos estancar isso, essa zona cinzenta que poderíamos chamar de "pré-bullyng homofóbico" do esporte bretão, inadmissível no atual cenário democrático do país", finaliza.

Medidas preventivas propostas pelo TJD

- Oficie-se ao Ilustríssimo Presidente da Federação Paulista de Futebol sugerindo campanha anti-homofóbica já neste final de Campeonato Paulista ou nos próximos campeonatos patrocinados pela Federação, inclusive com mensagens de alerta nos autofalantes dos estádios antes dos jogos.

- Oficie-se ao Presidente da Comissão de Arbitragem da FPF, para que seja recomendando a todos os árbitros filiados para registrarem em súmula quaisquer atitudes e comportamentos preconceituosos e discriminatórios das torcidas durante os jogos, para eventual apreciação pelo TJD.

- Oficie-se ao Presidente do Sport Clube Corinthians Paulista com cópia da decisão, sugerindo a sua difusão entre os seus torcedores, alertando-os que, de acordo com o CBJD vigente, o clube poderá ser punido com base na responsabilidade objetiva em casos de discriminação. (Art. 213 §4º. e 243-G e §§)


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