Vanderlei Luxemburgo vive a melhor fase desde que chegou ao Corinthians, há quase três meses. São seis jogos consecutivos sem perder, vitória na primeira semifinal da Copa do Brasil e vaga garantida nas oitavas de final da Copa Sul-Americana. Mas, para além dos resultados, o técnico se orgulha de uma outra realização: o uso de diversos jovens jogadores.
Pouco a pouco, a garotada foi ganhando espaço com Luxemburgo.
Alguns já estavam no elenco profissional e se consolidaram, como o zagueiro Murillo, que virou titular absoluto. Outros passaram a ter presença mais frequente nos jogos, casos de Matheus Araújo, Wesley, Felipe Augusto e Guilherme Biro. E ainda tem os que foram promovidos e estrearam com o técnico, como os meio-campistas Ryan e Gabriel Moscardo.
Felipe Augusto, Biro, Vitor Meer, Wesley e Pedro, jovens formados no Corinthians — Foto: Rodrigo Coca / Ag.Corinthians
A maior atenção e utilização das crias da base do Corinthians foi motivada por carências do elenco e a maratona de jogos enfrentada, mas também pelo gosto de Luxa e sua comissão técnica em trabalhar com jovens:
– Durante a carreira toda o Vanderlei revelou grandes craques. A minha vinda para trabalhar com ele, em 2019, agregou nesse processo, pois eu tinha passado pela seleção de base e tinha uma "expertise" com garotos. Juntou a fome com a vontade de comer – explicou Maurício Copertino, auxiliar de Luxemburgo, em entrevista ao ge.
– Temos um olho bom para jovens jogadores, mas não revelamos ninguém. Quem forma o atleta são os treinadores e os preparadores da base, a gente só dá oportunidade. E o Vanderlei tem coragem para colocá-los! – completou o braço direito do treinador.
Em trabalhos recentes no Brasil, Luxemburgo lançou garotos que não só contribuíram dentro de campo para seus clubes, como também renderam cifras milionárias em transferências. Vitor Roque, no Cruzeiro, Talles Magno, no Vasco, e Danilo, no Palmeiras, são alguns exemplos.
Ex-zagueiro e formado com Licença-PRO da CBF para treinador, Mauricio Copertino detalhou como é o trabalho da comissão de Luxemburgo com jovens jogadores e os cuidados adotados para extrair o melhor dos jovens, sem queimar etapas. Confira na entrevista abaixo:
Maurício Copertino é auxiliar de Vanderlei Luxemburgo no Corinthians — Foto: Rodrigo Coca / Ag.Corinthians
Essa utilização de diversos jovens na equipe foi um pedido da diretoria do Corinthians ou partiu do Luxemburgo e comissão?
– Quando chegamos aqui, o clube estava passando por uma turbulência grande, tivemos que agir em outras frentes, na nossa cabeça tinha muita coisa que precisava ser solucionada, era um processo bem difícil. Acredito que a diretoria sempre fica feliz quando usam a base. Penso que clubes que investem na formação de atletas deveriam ter pelo menos 35% do elenco vindo da base. O Brasil é uma fonte inesgotável de talentos. Porém, quando chegamos aqui, como tinha outras prioridades, não foi colocada essa situação pelo que o Vanderlei me passou.
Alguns desses garotos já estavam no elenco profissional...
– Sim, tinha já um legado do Fernando Lazaro, que tinha usado alguns jogadores. Ele é um cara que conhece muito o clube e passou situações de jogadores que já estavam jogando ou estavam na seleção sub-20. Dentro do processo natural, nos despertou o interesse de trazer esses jogadores para perto. Começamos esse processo, mais jogadores vieram, e o Vanderlei foi gostando.
– Com alguns jogadores saindo e as competições que se apresentaram, abriu espaço no elenco e culminou com a gente usando os jovens. Graças à competência do Vanderlei e a qualidade dos jogadores, a gente conseguiu estar vivo em três competições, rodando os atletas e dando oportunidades. Isso é importante para o clube, porque também gera receitas.
Vocês lançaram jovens jogadores mesmo em um momento de muita turbulência e pressão no Corinthians. Quais cuidados adotaram para não queimar os garotos?
– Temos regras que utilizamos, uma delas é no dia a dia do atleta, de ter esse cuidado, colocar ele sempre numa situação confortável em relação a responsabilidade dele. O Vanderlei tem muita coragem e tira a responsabilidade do jogador, dá essa proteção, e os jogadores mais experientes nos ajudam muito nisso. Com certeza, se não tivéssemos jogadores com história dentro do clube, seria muito mais difícil. Cássio, Gil, Fábio Santos, Fagner, Renato Augusto e vários outros atletas dão esse suporte para os mais novos.
– O Vanderlei gosta que eu tenha a proximidade do atleta e fale com ele. Do tipo: "olha, o professor gosta disso, não gosta daquilo, se fizer ele não vai ver com bons olhos... E os atletas têm entendido bem."
– Quando o jogador entende esse processo, mesmo tendo 17, 18, 19 anos, e o clube ajuda, nosso trabalho aparece muito mais. Do jeito que as coisas estavam antes, principalmente o fator externo, é difícil lançar jogadores. Mas foi uma necessidade que o Vanderlei visualizou. Aí vimos capacidade técnica e física dos jogadores que estavam vindo, e o Vanderlei não teve dúvidas de lançar os jovens, e as coisas foram acontecendo.
Você falou que o Luxemburgo gosta que você fique mais próximo dos atletas. Pode explicar melhor esse papel?
– Eu entendo o Vanderlei, estou sempre falando com ele, é um trabalho que faço há muito tempo. Chego no atleta e falo a real para ele: "você está vindo, estamos num processo assim, assim, assim, precisamos de um jogador dessa maneira, que faça esse tipo de trabalho." Eu oriento para que, quando ele vá para campo, procure fazer o que estou escutando que o Vanderlei quer.
– Por exemplo o Moscardo: várias vezes cheguei nele e falei: "procura trabalhar melhor, quando vier com a gente faz um trabalho defensivo importante", são situações que a gente vai visualizando no dia a dia e que facilitam muito nesse processo. O Vanderlei com seu jeito e sua sensibilidade, também vai chegando no jogador e falando coisas importantes, dá o suporte emocional. Enfim, é uma série de fatores. Esse "case" profissional aqui é muito difícil de acontecer: aliar resultado com revelar jogadores. Talvez as pessoas só notem mais à frente.
Como funciona a observação de jogadores? Vocês assistem aos jogos do sub-20? Tem alguém responsável por ajudar nessa interface do profissional com a base?
– A gente integra muito o pessoal da base conosco. Hoje (terça-feira) tivemos 13 jogadores da base para treinar com o profissional. O Vanderlei pediu para fazer um coletivo, um jogo mais aberto, para dar ritmo de jogo aos atletas que não atuaram. O que fazemos? Eu peço para o Alessandro (Nunes, gerente de futebol) e ele vai, dentro das posições precisamos, buscar jogadores do sub-20. Se o sub-20 está em competição, a gente busca no sub-17.
– Os jogadores acabam fazendo parte do nosso trabalho. Aí entra nosso olhar, nossa maneira de ver futebol, batemos o olho no atleta e falamos opa: esse jogador é interessante, tem capacidade técnica e física, pode vir outras vezes. Esse processo de transição a gente controla muito bem. Quando chego ao clube, faço uma visita à base e monto todo um mapeamento. Uso o programa Wyscout também e procuro ver jogos desses jogadores.
– Hoje fizemos o coletivo e tinham dois bons jogadores. A cada treino é uma situação diferente, tem jogador que não está bem no dia, temos que entender esse processo, de transição. No primeiro treino do Moscardo conosco ele não foi bem, não chamou tanta atenção, depois com outras oportunidades ele acabou mostrando quem era, até criar casca e esse lastro de falar "opa, vai ser importante colocar ele pra trabalhar com a gente".
O foco é no sub-20, certo?
– Estamos de olho também no sub-17, não descartamos nada. Já puxamos jogadores do sub-17 direto para o profissional. O Talles Magno foi um exemplo, ele estava no sub-20, mas com 16 anos. E o Vitor Roque era do sub-17 do Cruzeiro, fomos ver um jogo e achamos ele interessantíssimo, puxamos direto para o profissional.
Vocês têm contato direto com os profissionais da base?
– Eu falo muito com o Danilo (técnico do sub-20), inclusive falei com ele hoje. Quando solicito para o Alessandro os jogadores para o treino, a gente sempre conversa também com o técnico. Às vezes não conheço o atleta direito, então tiro dúvidas. O Danilo está no dia a dia com os caras. Depois do treino, se acontece alguma situação, ligo para ele, pergunto mais algumas coisas, isso faz parte do processo de formação, ter essa comunicação do profissional com o sub-20, do sub-20 com o sub-17. Uma coisa está ligada à outra.
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