O roteiro já é conhecido por Luiz Marcelo Morais dos Reis. Basta um jovem talento brasileiro vivenciar uma fase ruim nos gramados para ser rotulado pejorativamente de “Novo Lulinha”. Isso aconteceu recentemente com Endrick, 16, atacante do Palmeiras, que se reencontrou com os gols bem nas finais do Campeonato Paulista, coroando mais um título com a camisa alviverde.
Na ocasião, Lulinha, revelado pelo Corinthians em 2007, foi marcado numa postagem que atacava o jovem palmeirense. Aí entrou em cena o experiente Lulinha, hoje aos 32 anos de idade.
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"Eu discuti… Discuti, não. Debati com uma pessoa por causa disso. Quando se fala de jovens promessas remete-se muito ao Lulinha. Por quê? 'Ah, não deu certo', 'Não vingou', 'Fez 300 gols na base'. Acabaram me marcando numa postagem envolvendo o Endrick e falando: 'É o novo Lulinha'. Eu respondi: 'Ele tem 16 anos. Tem um talento incrível. Nós temos condições de ter um novo Ronaldo, Rivaldo, enfim, deixa ele jogar bola. As coisas vão acontecer. É muito jovem para ter uma cobrança excessiva'", disse Lulinha.
O meia-atacante já havia ficado impressionado com a cena de Endrick chorando ao ser substituído contra o Red Bull Bragantino, em 23 de fevereiro, em jogo pelo Paulista. A imagem rodou o mundo e gerou diferentes repercussões. É como se um filme sobre a forte pressão que também sofreu aos 16 anos, quando foi promovido precocemente da base do Corinthians, passasse por sua mente.
"Na época, quando eu escutava uma crítica, com 16 para 17 anos, aquilo acabava comigo. Eu entrava no quarto e não queria sair. Eu escutava e pensava: ‘Eu não sou isso. Não sou o que essas pessoas estão falando’. Eu não era forte mentalmente para poder entender, escutar e não absorver. Hoje não me afeta mais. Consigo ver, responder, debater", disse.
Lulinha admite que o segredo para que o jovem palmeirense possa se desenvolver passa pela estrutura, pela gestão de pessoas, pela fase do clube e, claro, pelo emocional.
"O conselho que eu dou ao Endrick é não perder sua essência, não perder sua humildade. Continua fazendo o que você vem fazendo, que é trabalhando, treinando. Está na mão de um dos grandes treinadores do Brasil, que é o Abel Ferreira. Fico feliz quando o Abel fala: ‘Deixe ele jogar. Parem de encher o saco do menino. As coisas vão acontecer naturalmente’. Futebol é muita confiança, muito momento. Se você faz um gol, você recupera a confiança. Então, assim, Endrick, joga bola, continue fazendo o que você vem fazendo. Talento você tem. Vai com calma, vai pra cima que tudo vai dar certo", disse Lulinha.
Endrick tem a mesma idade em que meia-atacante chegou aos profissionais do Corinthians em 2007. Também subiu com números e desempenho na base que impressionavam. E o assédio de equipes da Europa também foi precoce. A diferença é que o palmeirense já foi negociado com o Real Madrid por 72 milhões de euros.
Mas há diferenças significativas entre eles. Endrick tem um projeto de carreira desde que começou a chamar a atenção. É acompanhado pelo pai, Douglas Ramos, e pelo empresário Fred Pena em todos os passos. Tem ainda apoio psicológico e estrutural no clube.
Antes de chegar ao profissional, Lulinha já era badalado no Parque São Jorge. Carregava a marca de 297 gols na base, um recorde até hoje. Tinha como empresário Wagner Ribeiro, o mesmo que levou Robinho do Santos para o Real Madrid por 50 milhões de dólares, em 2005, mas não era comum naquela época o trabalho de acompanhamento psicológico.
Tão pouco se falava em plano de carreira. O fato é que Lulinha estava em evidência e dividia o tempo entre o Corinthians e a seleção brasileira sub-17. Só em 2007 foram três torneios oficiais com a amarelinha: o Sul-Americano (foi campeão e artilheiro, com 12 gols), os Jogos Pan-Americanos (1ª fase e três gols) e a Copa do Mundo (oitavas e um gol).
Clubes como Chelsea e Manchester United logo manifestaram interesse em Lulinha, que disse não a um emissário dos Red Devils. Ainda naquele ano, no final de novembro, quando acumulava 18 jogos e nenhum gol, assinou um contrato milionário para a época.
Segundo a "Folha de S.Paulo", ele passou a receber R$ 45 mil mensais e a multa rescisória com o Corinthians saltou de 4 milhões de dólares para 30 milhões de dólares.
Já na época muitos criticavam a hipervalorização.
"O Wagner Ribeiro estava fazendo o trabalho dele. Até porque eu estava em um processo de renovação. Então, ele estava visando um futuro pra mim, e o meu primeiro contrato profissional foi muito bom. Mas, às vezes, falta alguém chegar: ‘Vamos dar uma segurada’, ‘vamos tirar um pouco a pressão em cima dele’. Eu tinha mais dois anos de Taça São Paulo de futebol júnior para jogar. Se perguntassem para mim na época: ‘Quer jogar a Taça?’. Eu ia falar não. Eu tava no profissional, fazendo jogos quase todos de titular e vou descer para jogar a Taça? Às vezes falta um tato, uma conversa…", admitiu Lulinha.
O meia-atacante recorda que no elenco corintiano o zagueiro Betão e o meia Roger eram os poucos que tentavam ajudar os jovens a lidar com a pressão e a expectativa. Além dele, Dentinho, Diego Sacoman, Éverton Ribeiro e Willian tinham sido promovidos.
“O Betão sempre falava: ‘Vai e joga. Vocês vão errar, vão acertar. Vocês são garotos ainda. Vocês estão aqui para isso’. Tinha o Roger e o Marinho também, caras rodados que passavam confiança:. ‘Vai e joga seu futebol, o que você sempre jogou, que vai dar certo’”.
Hoje, Lulinha enxerga outro fator que teria possibilitado ele ter um desenvolvimento adequado e coerente com tudo que tinha feito até então na base.
“Assim, falando pra você, parece que estou vivendo o momento de novo. Realmente 2007 foi um ano de mesclas em sentimentos. Por quê? Porque foi o ano que eu realizei meu sonho de me tornar jogador profissional, mas foi o ano que no final acabou com o rebaixamento do Corinthians”, disse. “O Corinthians não estava passando só por problemas dentro de campo, mas também diretoria, presidente, aquela confusão toda. Vamos dizer que não era o momento para revelar ninguém”.
“Quando faltavam cinco ou seis jogos para acabar o Campeonato Brasileiro, falaram assim: ‘Vai e resolve’. Isso para um menino de 16 para 17 anos, que está ali vivendo seu melhor momento, como eu estava na seleção, eu falei ‘Eu vou’. Mas, quando as coisas não saem conforme esperado tanto para você ou para os torcedores e para as pessoas que estão próximas de você, causa uma frustração. Até você recuperar a confiança de novo isso requer um pouco de tempo e de pessoas também para trabalhar sua mente”, acrescentou.
Ainda que os jovens não tenham sido culpados pela torcida pelo rebaixamento, o meia-atacante conviveu com a pressão para corresponder à fama que o precedia.
Em 2008 e 2009, ele jogou pouco como titular, apesar de estar sempre presente nas partidas. Na soma, foram 63 jogos e 3 gols. Depois, ele teve passagens por Estoril e Olhanense, ambos de Portugal, e depois para o Bahia. Mas sempre por empréstimo.
Em 31 de dezembro de 2012, quando chegou ao fim o contrato com o Corinthians, foi dispensado. Tinha apenas 22 anos e era ainda jovem para o futebol.
Atualmente, Lulinha joga no Madura United, da primeira divisão da Indonésia. Tem feito um bom campeonato lá. O time é o quarto colocado. Ele tem 11 gols e cinco assistências.
O contrato termina em maio, assim que a temporada por lá acabar. Mas o meia-atacante já conversa para renovar, com o desejo de dar sequência a carreira.
Somando todo tempo no futebol, da base no Corinthians aos oito anos até hoje, Lulinha acumula 24 anos de futebol. Já vestiu 15 camisas diferentes. Foi campeão e artilheiro em alguns clubes. Por isso sempre rebate quando alguém usa o rótulo “Novo Lulinha” como sinônimo de fracasso para apontar o dedo para qualquer jovem jogador.
“Criaram perspectivas em cima de mim, assim como eu criei também, mas eu nunca fui frustrado. Nunca fui um cara que ‘Ah, caramba, não vou mais jogar bola’. Minha família me deu apoio. Mostrou que eu estava fazendo o meu melhor. Se não está acontecendo agora, vai acontecer em algum momento. As pessoas falam ‘não deu certo’. Não deu certo na sua visão. Eu continuo sustentando minha família, tendo, graças a Deus, do bom e do melhor graças ao futebol. Então, como eu não dei certo?”, disse o hoje experiente Lulinha.
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