21/1/2022 11:37

56 anos atrás, carinho da Fiel em chegada de Garrincha ao Corinthians emocionou Elza Soares

56 anos atrás, carinho da Fiel em chegada de Garrincha ao Corinthians emocionou Elza Soares
"A cada avião que surgia procurando aterrissagem, os gritos espoucavam: 'É esse, é esse!'." "Mas descia do aparelho um Caubi Peixoto, um Peri Ribeiro, artistas que vinham cumprir programas de TV. E nada do Mané."



Era esse o clima no aeroporto de Congonhas, em São Paulo, há pouco mais de meio século, segundo o relato de A Gazeta Esportiva. No dia em que Garrincha chegou para assinar contrato com o Corinthians, torcedores começaram a aparecer no início da tarde e aguardaram até as 20h, quando pousou o bimotor da Sadia que carregava a mais nova esperança alvinegra de encerrar um jejum superior a uma década.


A Fiel estava ávida por abraçar o Mané. E ele finalmente chegou, "trajando calça esporte de cor cinza", ao lado da companheira Elza Soares, "exibindo vestido de passeio moderno e elegante": "um casalzinho simpático". O craque foi festejado e vestiu sua nova camisa – buscada de última hora na casa de Rivellino, com o número 10 às costas. Ainda que não houvesse samba, lágrimas claras rolaram sobre a pele escura de Elza.


"Desculpem se estou chorando. Não posso evitar. Sabia que o povo de São Paulo me queria bem, pelos meus programas na TV. Mas estou vendo que o Garrincha é ainda mais querido. E isso me comove. Me toca o coração", disse a cantora, claramente esgotada, mas recusando a oferta de repousar enquanto o companheiro rumaria em jipe aberto ao clube. "Nada disso. Diga a eles que vou acompanhar o meu Neném até o Parque São Jorge. Estou cansada, mas vou até o fim."


E foi. Lá estava ela, na zona leste de São Paulo, observando o foguetório armado para o reforço e ouvindo a tradicional sirene acionada no Corinthians para anunciar grandes contratações – bem antes da banalização que a acionou até para celebrar Paulo Nunes. O hino alvinegro, repetido à exaustão, não foi acompanhado pelo festejado. "Não se incomodem, meus amigos. Tenho dois anos de prazo para decorar essa cantiga. E isso vai acontecer em todas as vezes em que eu contribuir, com meus esforços, para uma grande vitória do Corinthians", justificou, ganhando total compreensão. "Sou Corinthians. Corinthians, Corinthians. De corpo e alma. Querendo ser campeão".



Ainda de acordo com A Gazeta Esportiva, já em uma área reservada do Parque, "Elza, esfalfada, sentou-se num sofá, e o Mané aceitou, gostosamente, o abraço alvinegro da Elisa", a grande torcedora-símbolo da história do clube preto e branco. Foi assinado um contrato de dois anos, a vencer em 14 de janeiro de 1968. Para tirar o camisa 7 do Botafogo, o presidente Wadih Helu topou comprar seu passe por 220 milhões de cruzeiros (cerca de 100 mil dólares).


Era só um décimo do valor oferecido por clubes italianos, dois anos antes – por um milhão de dólares, o ponta-direita assinaria um contrato de três temporadas, defendendo uma equipe a cada 12 meses: Juventus, Internazionale e Milan. Porém, em 1966, Garrincha contava 32 anos, com problemas sérios no joelho e dependência alcoólica. "Se qualquer revelaçãozinha vale 100 milhões, fizemos um alto negócio contratando um bicampeão do mundo por 200 milhões", bradou o técnico Oswaldo Brandão.


O gaúcho estava empolgado com seu novo jogador. Ele o havia escalado na Seleção Brasileira, na década anterior, e fez questão de ir ao Rio de Janeiro para convencê-lo a se banhar na garoa paulistana. "Fui lá e conversei com o homem. Fiz-lhe ver as vantagens de uma transferência para São Paulo. Ele precisava mudar de ambiente para o seu próprio bem", afirmou o comandante do fim do jejum corintiano – em 1977, não em 1966.


A campanha de Brandão e o abraço da Fiel foram um forte contraste em relação ao que tinha sido observado no melancólico fim da trajetória de Mané no Botafogo. A última partida com a estrela solitária no peito foi em 15 de setembro de 1965, com pouco mais de 5.000 pessoas em General Severiano. “Já não havia amor nem ódio na relação entre eles – apenas um misto de piedade e indiferença”, relatou o biógrafo Ruy Castro.



Em São Paulo, o que se viu passava bem longe da piedade e da indiferença. Cada passo do craque, que se instalou em um apartamento em Higienópolis providenciado pelo Corinthians, era acompanhado de perto. Foram quase dois meses entre a recepção calorosa e a estreia, com a massa alvinegra aproveitando o período para impressionar um jogador acostumado a uma torcida de outra dimensão, ainda que com as mesmas cores.


“Não tem tamanho. Em cada lugar que a gente anda, esbarra sempre em corintiano. Todos desejam saber como me encontro e quando dará para jogar”, disse Garrincha, em declaração publicada na edição de A Gazeta Esportiva de 20 de fevereiro. "Achava que a torcida do Botafogo era grande. Depois vi a do Flamengo. Mas acho que como a do Corinthians não há. E, note-se, ainda nem entrei na equipe e não pude mostrar o que posso fazer."


O bicampeão mundial não era o único reforço. O ponta de lança Tales havia chegado da Ferroviária, sem grande estardalhaço, e mostraria bastante eficiência. Com um orçamento alto berrado pelo presidente Wadih Helu, a agremiação do Parque São Jorge foi ainda à Portuguesa e dela tirou Ditão, beque marcante em preto e branco, e Nair, meia que acabou não sendo tão marcante assim. Ótimo coadjuvante de Garrincha na Copa do Mundo de 1962, Amarildo começou a dizer na Itália que adoraria deixar o Milan e se juntar ao velho companheiro de Seleção.


Pintava um timão.


A Gazeta Esportiva – responsável, na figura de Thomaz Mazzoni, pela criação do mascote mosqueteiro e dos nomes dos clássicos contra Palmeiras (Derby) e São Paulo (Majestoso) – referiu-se pela primeira vez ao Corinthians como Timão, ainda entre aspas. Foi justamente na primeira vitória da principal contratação, 2 a 1 sobre o Cruzeiro no Mineirão, com o triunfo definido por uma perna torta. O resultado "'Timão': 2 a 1" acompanhava o título "Mané foi 'show', alegria e gol da vitória em Minas".


Mané não foi show muitas vezes naquele ano. Tampouco a equipe justificaria, ao longo de 1966, o apelido que sua torcida viria a gritar com tanto orgulho. O título do Torneio Rio-São Paulo, por falta de datas por causa da preparação da Seleção para a Copa do Mundo, foi dividido com Botafogo, Santos e Vasco, sem que qualquer alvinegro tivesse a cara de pau de se declarar livre do jejum. No Campeonato Paulista, que era o que interessava, a maior festa foi derrotar o quase campeão Palmeiras na penúltima rodada e adiar a festa do arquirrival.



Garrincha nem mesmo chegou a 1967 como jogador do Corinthians. Oswaldo Brandão deu lugar a Filpo Nuñes, que não o colocava nem no banco. Depois, chegou Zezé Moreira, seu velho comandante no Botafogo. A boa vontade não impediu o treinador de confidenciar a amigos, no Rio: “É triste dizer isso, mas Garrincha acabou”. Em dezembro, o camisa 7 pediu para ser liberado e ouviu resposta positiva de Wadih Helu. Nem o responsável pela contratação do jogador via mais sentido em sua permanência.


O velho craque não foi a solução para o jejum alvinegro, que ainda teria sua duração dobrada. Mas o fato de o ídolo brasileiro ter aparecido por baixo, lutando diariamente por sua recuperação, provavelmente contribuiu para sua identificação com uma torcida que já estava habituada ao sofrimento e, naquele período amargo, entregava-se definitivamente a ele. A óbvia associação foi feita pelo próprio ponta-direita, tido como alienado do mundo à sua volta.


Foi em um momento de alegria, após o gol da vitória sobre o Cruzeiro, que ele apontou um paralelo entre sua situação e a do time. “Meu problema é igual ao do Corinthians. O clube está lutando para ser de novo campeão. Nesse esforço todos os jogadores estão unidos e empenhados”, disse, apontando na sequência seu próprio esforço para recuperar a velha forma. “É um momento do qual participo, com aplicação e fé.”


Por isso, o Mané não chegou a ser cobrado pela massa exigente e carente. De volta do fracasso verde-amarelo na Copa do Mundo, ele foi gradativamente esquecido até partir discretamente. Deixou para trás, no entanto, se não um timão, um Timão (eô). E momentos como o de 22 de janeiro, ainda em sua segunda semana no Parque São Jorge, dia em que “assinou o ponto e ganhou abração de Elisa”.



Aquela não foi a primeira nem a última vez em que a simpática senhora representou toda uma nação ao abraçar o craque – como fez com Sócrates e outros. Garrincha havia apelidado Pelé de Elisa, no Mundial de 1958, por ver semelhança física entre eles e adorar um apelido, mas só em 1966 sentiu a incrível força dos braços magros que valiam por milhões.


“’Seo’ Mané chegou para vestir a camiseta preta e branca do amor popular. Elisa deu um abraço com oitenta milhões de braços. Garrincha recebeu nesse abraço o calor humano e o agradecimento de oitenta milhões de corações”, escreveu Renato Reis Barbosa, em texto publicado por A Gazeta Esportiva em 16 de janeiro de 1966. “Doravante, marcharão juntos, vibrarão em consonância com a maior torcida clubística do mundo.”


Eles não marcharam à terra prometida, missão cumprida apenas quando o mar foi aberto por Basílio. Porém, ali, naquele abraço de esperança e sofrimento, estava toda a síntese do time do povo. Bem além da dor, por mais que ela seja o maior orgulho preto e branco.


“É o abraço que simboliza a união de dois patrimônios sentimentais do Brasil:


de Garrincha – a alegria do povo,
do Corinthians – o amor do povo!”



*Reportagem originalmente publicada pela Gazeta Esportiva em 2 de março de 2016. Elza Soares faleceu nesta quinta-feira, 20 de janeiro, de causas naturais, no mesmo dia que Garrincha, 39 anos atrás.

#corinthians #timao #alvinegro #garrincha #elzasoares


VEJA TAMBÉM
- Timão escalado para o jogo contra o Juventude
- Corinthians e Atlético-MG empatam na estreia do Brasileirão
- Timão escalado para o jogo contra o Atlético-MG









1398 visitas - Fonte: Gazeta Esportiva

Mais notícias do Corinthians

Notícias de contratações do Timão
Notícias mais lidas

Nenhum comentário. Seja o primeiro a comentar!

Enviar Comentário

Para enviar comentários, você precisa estar cadastrado e logado no nosso site. Para se cadastrar, clique Aqui. Para fazer login, clique Aqui ou Conecte com Facebook.

Últimas notícias

  • publicidade
  • publicidade
    publicidade

    Brasileiro

    Dom - 16:00 - Neo Química Arena -
    X
    Corinthians
    Atletico-MG

    Sudamericana

    Ter - 19:00 - Neo Química Arena
    4 X 0
    Corinthians
    Nacional Asuncion
    publicidade
    publicidade
    publicidade