Guilherme Arana desce de seu carro importado, observa o movimento do outro lado da rua e, enquanto arruma o boné (de sua própria marca), provoca Ramom, um amigo são-paulino que se aproxima.
– E aí, Gordão! Escaparam, né? – diz o jogador, fazendo referência ao risco de rebaixamento do clube do Morumbi.
O lateral-esquerdo, que a partir do ano que vem defenderá o Sevilla, da Espanha, estava à vontade naquela noite de segunda-feira, dia seguinte à festa do título brasileiro. Era dia de jogo no Corinthians... do Aricanduva. A acanhada quadra localizada na Zona Leste de São Paulo receberia dali a algumas horas uma decisão de futsal. O União Formosa, time da Vila Formosa que tem Arana como torcedor, enfrentaria o Zero Grau, do Jardim São Pedro, valendo vaga na final de um campeonato amador.
Antes de ir ao jogo, porém, Arana fez uma parada estratégica. Acompanhado do amigo Buh, aquele palmeirense provocado em rede nacional pelo lateral, ele foi ao Bar do Japonês, que serve como sede da torcida Fúria Jovem do União Formosa. Trata-se de um boteco simples, do tipo que tem mesa de plástico, cerveja "litrão" barata e que no almoço cobra R$ 12 pelo prato feito.
Lá, enquanto o jogador se divertia ao encontrar velhos conhecidos, uma caixa de som tocava em alto volume um clássico do grupo de rap Racionais Mc's.
Arana conhece – e gosta – daquele mundo. Criado em Sapopemba, também na Zona Leste, ele se mudou para a Vila Formosa há cerca de três anos, quando deixou a equipe de juniores e passou a ganhar dinheiro e fama. Apesar de viver na parte nobre do bairro, o lateral tem presença frequente na "quebrada" e nas partidas do União.
– Ele vem a todos os jogos, está sempre aí – conta o goleiro China.
Se havia alguma dúvida da autenticidade da relação de Arana com o time, ela foi desfeita na chegada do lateral à arquibancada. No meio da bateria da Fúria Jovem, ele pulou, sofreu, acendeu sinalizador e mostrou conhecer o repertório de músicas da torcida, que tem de provocações a equipes de bairros vizinhos, como o Carrão, a gritos de "ladrão devolve o futebol pro povão".
– Para a gente que joga, até para vocês (jornalistas), que estão lá trabalhando, não fica mais bonito quando acende um pisca, sobe uma bandeira e tem as duas torcidas lá? Aí você faz um gol, quer zoar a outra torcida e não tem. Está muito chato o futebol. O problema não é dentro do estádio, é fora – disse o lateral, contrário ao que chama de futebol moderno.
Para o União Formosa, o show da torcida é quase tão importante quanto o resultado em quadra. Prova disso é que a partida daquela noite atrasou em quase meia hora por conta da fumaça provocada pelos sinalizadores, mas ninguém reclamou.
Apesar da festa, Arana se despediu de sua equipe de uma forma indesejada. O time da Vila Formosa foi goleado por 7 a 1 naquela noite e acabou eliminado.