Imagem: Daniel Augusto Jr/Agência Corinthians
William Shakespeare é um dos fenômenos da humanidade. O inglês escreveu, quatro séculos atrás, peças de teatro e poemas imortais, que retratam sentimentos eternos que nos acompanham na aventura terrestre. Uma das frases mais famosas da história das artes, se não for A mais famosa, é "Ser ou não Ser, eis a questão", dita por Hamlet, o príncipe da Dinamarca obcecado por desejo de vingança. Sujeito porreta esse William, modelo para literatos e artistas até hoje.
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E, como sou cara de pau, tive a desfaçatez de usar o mote do coitado do Hamlet e adaptá-lo para dilema que afeta elencos e torcedores de Palmeiras e Corinthians nos primeiros bocejos de 2020. Veja você, caro amigo, como futebol e Shakespeare se aproximam... A dúvida existe, e transparece em declarações aqui e ali. Até quando jogadores se esquivam, como o fizeram os palestrinos Dudu e Felipe Melo em conversa com a imprensa nesta quinta-feira. O primeiro falou, falou e não disse nada. Muro. O volante foi mais sucinto: "Prefiro não comentar." Pra mim, disseram tudo.
Não precisa ser gênio da lâmpada para deduzir que a disputa do quadrangular na terra do Mickey não desperta paixão entre os boleiros. No que estão certos. Não pelo torneio, que em si é bacana, iniciativa boa para aproveitar período em que Orlando está cheia de turistas, sobretudo brasileiros e demais sul-americanos. O nó está no calendário. Para os atletas daqui se trata de início de temporada, período que deveria ser aproveitado para dar-lhes condições físicas para suportar o ritmo até dezembro. No entanto, deverá ser suprimida uma etapa, nem sempre com desdobramentos satisfatórios.
A rapaziada se reapresentou no começo da semana, todos ainda tirando a inhaca das férias e o excesso de espumante, panettone, bacalhau e rabanada das festas de fim de ano. Nem fôlego têm para meia hora de bate-bola. Porém, para honrar compromissos firmados por cartolas, embarcam no sábado para dois jogos na Flórida em menos de uma semana. Alguém pode alegar que não é nada de sobrenatural que se exige deles e que os europeus também fazem isso, com giros pelos EUA e Ásia. Verdade, com uma diferença: os gringos ficam pelo menos dez dias, ou até duas semanas, em retiro em casa ou nos arredores, antes de irem faturar por aí. E alguns já quebraram a cara por programação inadequada.
Por mais que se tente destacar o caráter festivo da Florida Cup, inevitáveis serão as cobranças. Ou você acha que, se Palmeiras e Corinthians fizerem feio, não haverá cornetagem? Não tenho dúvidas que ouvidos ficarão vermelhos. O raciocínio é simples e impiedoso: jogadores vestiram os mantos sagrados, os ingressos são pagos (e alguns bem salgados), tem juiz, bandeirinha, transmissão por tevê? Então, não há como passar batido o que fizerem em campo. Vice-versa o contrário, também haverá quem se iluda com eventual sucesso dos times. "Taí o trabalho do professor!", "O elenco para este ano não vai decepcionar", etc. e tal.
Vejo riscos maiores para o Corinthians. Explico. O Palmeiras por ora tem só o Paulistão como compromisso oficial. Só por muita zebra não passará pela fase de grupos. Vanderlei Luxemburgo até pode usar a Florida Cup como laboratório. Já Thiago Nunes tem desafios maiores. O primeiro é o de montar a equipe-base, com quem vem de 2019 e com os que estão chegando. Não custa lembrar que ele mesmo é novo de casa, chegou com expectativa e com responsabilidade de mostrar serviço.
E o serviço mais árduo é o de armar time para disputar as etapas preliminares da Libertadores. Imagine se não obtiver vaga, o prejuízo técnico, moral e econômico? Taí o São Paulo para despertar o alerta. No ano passado, a turma tricolor embarcou para a Florida Cup crua, crua. Não fez grande coisa por lá, perdeu bem uns quatro dias de treinos e levou pancada na Libertadores. Por um punhado de dólares?!
Bem, o Corinthians terá mais tempo do que o São Paulo na ocasião, porque estreia em fevereiro. Meia-verdade. Os corintianos terão clássicos com Santos (antes) e São Paulo depois dos jogos da primeira fase de qualificação na Libertadores. Não sou contra a presença de brasileiros nessas manifestações. Só considero que os dirigentes precisam ser cautelosos ao receberem convites. Deveriam pedir cláusula no contrato que lhes permitisse desistir, ou enviar time reserva, se estivesse em jogo vaga na Libertadores.